segunda-feira, 11 de abril de 2016

Zumbis consumistas e desejos mercadológicos: Uma ode à "felicidade" consumista


Hobbes já dizia que se o homem é desejante, então, o mundo é uma guerra de todos contra todos. A verdade é que o desejo sempre foi alvo de estudo entre as mentes mais brilhantes ao longo da história. Posto isso, há de se considerar o seu valor na constituição do ser. O mercado, sempre perspicaz, atentou-se para isso e construiu a fórmula de ouro da felicidade contemporânea.

Antes de adentrar nessa fórmula, faz-se necessário uma análise sobre a mudança paradigmática da estrutura capitalista, para que a problemática seja entendida. Grosso modo, a partir do século dezenove, após as revoluções burguesas do fim do século dezoito, há a derrocada dos resquícios feudais presentes na sociedade moderna. Dessa forma, a sociedade moderna industrial transfere o papel redentor da Igreja para o Estado, assim como fez os patrões serem respeitados como sacerdotes.

Na grande igreja do capital, as ovelhas, vendedoras de sua mão de obra, reforçam o valor do trabalho. No entanto, o consumo não era um fator determinante na produção, tanto é assim, que as jornadas de trabalho eram muito maiores do que hoje. Além disso, a ideia de poupar, acumular bens era vista sob a ótica protestante, como sinal de predestinação. Sendo assim, havia uma limitação ao consumo.

Esse sistema perdurou até a década de 60 do século passado, quando há, então, a mudança paradigmática do sistema capitalista, em que o mercado estagnado, enxerga no consumo a solução dos problemas. Todavia, para que o consumo fosse estimulado, deveria existir o desejo em consumir. O marketing, a menina dos olhos do mercado, tratou de criar necessidades, até então inexistentes, a fim de que o desejo em consumir fosse estimulado.

Sendo assim, muda-se a moral capitalista, que sai de uma estrutura poupadora, de acúmulo de bens, para uma estrutura que mede o sucesso pelo volume de compras. Ou seja, cria-se uma fórmula da felicidade, em que a esta seria o resultado de um desejo satisfeito.

Há de se perguntar, então, qual o problema nisso. E a resposta, embora, simples, passa despercebida. Toda fórmula determinista gera muitos frutos podres. Logo, criar uma fórmula de felicidade tão somente a partir do consumo implica grandes problemas, uma vez que se não tenho os meios necessários para satisfazer o meu desejo, torno-me para o seio social, automaticamente infeliz. Dito de outro modo, se não possuo os meios que me permitem uma vida voltada para o consumo, estou inapto à felicidade.

Cria-se, portanto, uma rede aprisionadora, em que, embora estejam em uma gaiola muito bonita, esta ainda é uma gaiola, que retira a liberdade do indivíduo e o impossibilita de pensar e agir por si mesmo. O mundo torna-se uma ode ao consumo, ou como prefere Fromm:
“O mundo é um grande objeto de nosso apetite, uma grande maçã, uma garrafa, um grande seio; somos sugadores, os eternamente em expectativa, os esperançosos – e os eternamente decepcionados. Nosso caráter é engrenado para trocar e receber, para transacionar e consumir tudo, os objetos espirituais como materiais, torna-se objeto de troca e de consumo.”
Nesse prisma, o homem também está incluso nessa rede inesgotável de consumo e como tudo deve ser constantemente trocado, e nós também, somos mercadorias, logo, também somos periodicamente trocados. Isto é, para que essa estrutura tenha sucesso, é preciso que haja necessidades ilimitadas para o homem, a fim de que o seu desejo seja renovado e, assim, busque consumir coisas novas.

Assim, há uma total perda do sentido entre o que importa e o que não importa, pois tudo se converte em uma grande rede descartável. Aqui se encontra o grande problema, pois com essa descartabilidade deixa-se de se valorizar as pessoas e os sentimentos, ou seja, os elementos necessários à criação de laços e que mantêm as pessoas verdadeiramente unidas.

Não existe problema em consumir, mas sim, em viver uma vida para o consumo, de forma que tudo aquilo que seja desprovido de um valor econômico seja visto como desnecessário. Ademais, a felicidade é algo totalmente subjetivo, participar de uma orgia consumista de necessidades criadas por um terceiro alheio ao que me forma, apenas retroalimenta o consumo e me torna mais sozinho, triste e infeliz.

Deixa-se de ser quem se é, para ser apenas um zumbi que consome, e pior, consome necessidades que fogem totalmente ao seu caráter, apenas para se sentir “incluído” e “feliz”. Um zumbi alienado dos outros, da natureza e de si mesmo, que não enxerga outra coisa a não ser mercadorias, afinal nesse conto de fadas da felicidade:
“A vida não tem meta exceto a de movimentar-se, nem princípio a não ser o da boa troca, nem satisfação que não seja a de consumir.”

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